Atenção*

* Hoje no Jornal do Centro


1. Quando alguém se foca em algo exterior a si, esse alguém está a aprender. Para aprender é imperativo prestar atenção e tudo indica que a atenção das pessoas é uma matéria-prima em declínio. Há cada vez mais gente a falar e, quanto mais falam os falantes, menos ouvem os ouvintes. E quanto mais falantes há, menos ouvintes há disponíveis.

Os professores sabem bem isso e tratam de, ao mesmo tempo que dão a matéria, manter debaixo de olho os alunos. Eles sabem que é cada vez mais difícil manter os alunos atentos, mesmo na ecologia ideal de uma sala de aulas em que os papéis e os tempos para os vários emissores e receptores estão bem definidos. Vamos lá ver se conseguem recuperar os 9A 4M 2D que a geringonça lhes quer roubar.

Fora das escolas o panorama é pior. Há para aí cada vez mais gente a falar sozinha sem dar conta disso. Muitos dos que dão conta, em desespero por audiências, até fazem o pino em posts no Facebook.

Já o devo ter dito aqui mas repito-o: como a atenção é cada vez mais rara, ela ainda vai ser paga. E, como sempre, quando isso acontecer, os ricos vão receber mais do que os pobres.


Fotografia de Lacie Slezak

2. A professora N. Katherine Hayles identificou dois tipos de atenção:

— a “atenção profunda”, que se concentra num só objecto durante um longo período de tempo, é capaz de ignorar estímulos externos e perseverar em objectivos de longo prazo, como por exemplo na leitura de um livro;

— a “hiperatenção”, sempre “a mudar de foco entre várias tarefas”, a fazer zapping, prefere “fluxos múltiplos de informação”, procura “um nível elevado de estimulação e tem uma tolerância baixa” à seca, ao chato.

É claro que umas vezes funcionamos em “atenção profunda”, outras vezes em “hiperatenção”, e que ambos “estilos cognitivos” têm vantagens e têm inconvenientes. Mas não é arriscado afirmar que a primeira maneira de conhecer o mundo está a perder terreno para a segunda e que essa perda é maior nas novas gerações.

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