Atílio dos Santos Nunes
No virar do século, conheci Atílio Santos Nunes, então ele a presidente da câmara de Carregal do Sal, pelo PSD, e eu a vereador em Viseu, pelo PS, e mais uns fazeres na área do ensino recorrente que me faziam ir àquele concelho com alguma regularidade e encontrar-me com aquele competente e bem-humorado autarca.
Competente, sim: Atílio dos Santos Nunes conseguiu que o seco Cavaco Silva lhe fizesse uma auto-estrada entre Canas de Senhorim e Carregal, uma auto-estrada sem princípio, nem fim, nem portagem, só conveniências para quem lá passava. Foi o início do IC12 que, depois, muito depois, seria prolongado até ao IP3, em Santa Comba Dão, falta ainda o troço de Canas a Mangualde. Aquela rodovia devia adoptar oficialmente a sua designação oficiosa: "auto-estrada do Atílio".
Bem-humorado, sim, e com uma extrema habilidade para derreter o coração dos decisores políticos e levar a água ao seu moinho. Para início de qualquer conversa, Atílio apresentava-se dizendo: «sou um pedreiro com a quarta classe feita à noite.» Tomaram muitos professores doutores chegar-lhe aos calcanhares.
Em 2001, na agonia do guterrismo, no PS nacional ferviam as traições e as facadas nas costas. No PS-Viseu, idem, idem, aspas, aspas. Nesse ano eu fui candidato socialista à câmara de Viseu e, entre Maio e Dezembro, levei a minha dose.
Uma delas foi no dia 14 de Agosto, dia na inauguração da Feira de S. Mateus, em que o corta-fita tocou a um ministro socialista que, no discurso inaugural, fez uma oratória a hiperbolizar as façanhas do dr. Ruas do princípio ao fim. O ministro rosa arrebicocorou-se todo em panegíricos ao edil social-democrata. Foi um convite do princípio ao fim ao voto laranja.
Eu, o esfaqueado, mantive-me impassível. Já sabia o que a casa gastava. Embora não tenha batido palmas no fim, era o que mais faltava.
Seguiram-se os "shake-hands" cerimoniais, a descida luzidia dos vips na notável e bela escadaria da câmara municipal, onde, no tecto, avultam os retratos fabulosos de vinte e quatro viseenses ilustres.
Ainda antes das duas escadas se fundirem numa, o presidente Atílio virou-se para mim e disse e toda a gente à volta ouviu:
«Com socialistas assim, estás fodido, Alex!»
Eu estava fodido. Sabia disso desde o momento em que aceitei aquela empreitada. Sorri-lhe.
Quando nos despedimos, naquele dia, dei-lhe um abraço forte de gratidão.
Atílio dos Santos Nunes morreu hoje. Com 79 anos. Era um homem bom.
Fica aqui este testemunho.
Li e recordei:
ResponderEliminarIt matters not how strait the gate,
How charged with punishments the scroll
I am the master of my fate:
I am the captain of my soul.
– William Ernest Henley - "Invictus"
I am the captain of my soul-sempre!
Brilhante,Sr.Gato!
O que nos vai valendo são essas pessoas e essas memórias que ainda nos deixa algo de bom...
ResponderEliminarConheci o senhor Atílio. Era amigo do meu pai. Partilho da tua opinião
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