Vertentes

As palavras esperam o sono 
e a música do sangue sobre as pedras corre
a primeira treva surge
o primeiro não a primeira quebra


A terra em teus braços é grande
o teu centro desenvolve-se como um ouvido
a noite cresce uma estrela vive
uma respiração na sombra o calor das árvores


Há um olhar que entra pelas paredes da terra
sem lâmpadas cresce esta luz de sombra
começo a entender o silêncio sem tempo
a torre extática que se alarga


A plenitude animal é o interior de uma boca
um grande orvalho puro como um olhar


Deslizo no teu dorso sou a mão do teu seio
sou o teu lábio e a coxa da tua coxa
sou nos teus dedos toda a redondez do meu corpo
sou a sombra que conhece a luz que a submerge


          A luz que sobe entre
          as gargantas agrestes
          deste cair na treva
          abre as vertentes onde
          a água cai sem tempo
                                                  Herberto Helder

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