Aral / Kyoto Sanga F. C.
Marco DaSilva, “El Negrito” (2018) |
se me sinto/sento como moby-dick à mesa do jantar, à hora do
café, no jardim
se me sinto/sento como moby-dick/jesus/tolstói
à hora do jantar, no café, à mesa do jardim
se você
fatia sementes e passa geleia ou manteiga
no pão
e se me sento/tento
disfarçar/não atropelar idosos/sinto dores
no menisco
e se o entregador de água da JL Cunha da regata vermelha
é mais veloz e forte
do que eu
(do que nós)
– e ele é –
e a geleia de damasco chega ao fim todas as quartas-feiras
do mesmo mês
e se marimbondos
constroem casas
nas janelas
e o cheiro da grama cortada atravessa a praça
no caminhão de mudanças
e se pode ser que eu vá à praia ou pode ser que não
e se me sento pra escrever/pedalar/almoçar/escrever/pedalar/almoçar todos os dias
e como Matsui tenho pensamentos
que não são
dele
e se no universo não existem
estatísticas
(e se
não podemos acreditar em ideias
nas quais os músculos não tenham
festiva parte) –
se alguém ordena sons
enquanto um outro lê
galáxias num sofá em Sangha
se alguém quer
que o mundo acabe
quando tudo ainda está
bem
ou quando só sobrou a gente
sobre a pedra-
cicatriz
e se é tão fácil
de imitar você
e se você
é uma máquina
de falar/pensar/imitar
um poema se você
é uma máquina
de imitar/falar/pensar em máquinas
que imitam/pensam/falam
poemas e legendam
o mundo
de um modo horrível
e se tudo isso for só
isso mesmo se tens toda
a razão – se também machuco o peito
na última virada
e como
Zoroastro
numa torre
do silêncio
em ruínas
pratico a arte de fazer
loops
e então me sinto/sento
como um grande corpo–d’água
à beira do dique, em Kokaral
e se me sinto/sento
com as contribuições lexicais
do Kimbundo
num oásis em Ghutah
e o ovário/vórtice que conecta tudo
conecta
uma aresta que existe
a uma outra
que não existe
e a grande diferença entre tudo/todos
entre Jorge Contreras & nós
é que Jorge Contreras era só um cara
com quem meu pai jogava xadrez num bar chamado La Luna Agata,
no México
e nós amamos o Camboja,
daqui.
Catarina Lins
Comentários
Enviar um comentário