Os barcos de Bezos, Catarina e Jerónimo — o abanão das legislativas*

* No Jornal do Centro aqui

1. O sr. Jeff Bezos mandou fazer um super-iate à Oceanco, uma categorizada construtora naval sediada em Roterdão, nos Países Baixos. A encomenda do dono da Amazon, no valor nada despiciendo de 430 milhões de euros, foi recebida com júbilo por aqueles estaleiros e os trabalhos, que estão agora a aproximar-se dos “finalmentes”, ajudaram muito a economia local.

Há um problema: aquele mastodonte de três mastros, com 40 metros de altura, não passa na única saída do estaleiro para o mar, onde há uma ponte que vai ter que ser desmantelada para ele passar. Trata-se de uma ponte histórica em ferro, construída em 1877, que tem sofrido várias vicissitudes: foi bombardeada pelos nazis e reconstruída a seguir à guerra, em 2017 sofreu nova intervenção que era suposto ser definitiva e afinal não é: a secção central da De Hef — é assim que ela é conhecida — vai ter que ser retirada para passar aquele barquito. Uma trabalheira. O sr. Bezos paga tudo mas não deixa de ser uma chatice.

Daqui

No final de Outubro, na votação do orçamento, Catarina Martins e Jerónimo de Sousa encomendaram umas eleições antecipadas nos estaleiros navais da Assembleia da República. 

Estava-se mesmo a ver que aquela encomenda era uma péssima ideia. Nas eleições de domingo, o abanão no barco do Bloco deitou borda fora catorze tripulantes, ficaram cinco. No do PCP, metade da equipagem foi à água, tinha doze, ficou com seis. Para além disso, toda aquela agitação marítima fez com que o navio comunista perdesse um escaler chamado Os Verdes que, desde 1983, trazia atracado a si.


2. No domingo, o eleitorado abanou com força o sistema partidário:

— a maioria absoluta de António Costa retirou gás à ala pedronunista (mais estatista e identitária);

— os dois ex-parceiros da geringonça ficam num nicho estéril, o de partidos de protesto;

— desapareceram do parlamento dois partidos históricos: um real (o CDS) e outro virtual (Os Verdes);

— muitas caras novas no hemiciclo, nas bancadas do Chega, IL, PS e PSD (neste caso, não por crescimento, mas por causa da purga que Rui Rio fez aos rangelistas);

— poderá ter acontecido uma alteração qualitativa no funcionamento parlamentar, com a presença dos deputados “anti-sistema” do Chega, mas isso só será confirmável com o teste do tempo;

— passámos a ter também grupos parlamentares de duas forças políticas influentes  na “Europa”: a ultradireita e os liberais;

— ainda não temos um partido verde forte; o PAN, depois da saída de André Silva, entrou em declínio; Rui Tavares, que fez uma muito interessante campanha eleitoral, poderá ocupar este vazio político; para isso, precisa de mudar a natureza do Livre, que, por enquanto, pouco mais é do que um partido unipessoal.

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