Inquietação*

* No Jornal do Centro aqui


Cá dentro inquietação, inquietação

É só inquietação, inquietação

Porquê, não sei

Porquê, não sei

Porquê, não sei ainda


Há sempre qualquer coisa que está pra acontecer

Qualquer coisa que eu devia perceber

Porquê, não sei

Porquê, não sei

Porquê, não sei ainda


Esta “Inquietação”, de José Mário Branco, é uma excelente banda sonora para dias como estes que estamos a viver. Dias em que está muita coisa a acontecer e não se sabe ainda porquê. 

O governo de António Costa acaba de enviar uma proposta de lei para ser discutida com urgência no parlamento que, se for aprovada, tornará “obrigatória, no contexto laboral ou equiparado, escolar e académico, a utilização da aplicação StayAway Covid pelos possuidores de equipamento que a permita”.

Esta proposta é um erro grosseiro que faz tábua rasa de todas as garantias dadas pelos políticos e os técnicos sobre o rastreio electrónico de contactos na “Europa”. Em 13 de Maio, a UE assegurou aos cidadãos europeus que “o uso da aplicação é voluntário”, que ela pode ser desinstalada “a qualquer momento” e que “será desativada automaticamente no final da pandemia”. Ora, o governo português, pelos modos, quer pôr as polícias a cuscarem os telefones das pessoas e a passarem-lhes coimas de 100 a 500 euros caso elas estejam away da StayAway Covid.

Daqui

Que se passa? Há aqui “qualquer coisa que está pra acontecer” que não se percebe. Nada no histórico de António Costa fazia prever este gesto autoritário. Vindo de Sócrates ou de Cavaco não estranharia. De Costa é uma completa surpresa. 

Que se passa na cabeça do primeiro-ministro? Que lhe está a acontecer neste ano da peste? Foi o corte nos debates quinzenais no parlamento. Foi preferir um boy para a Procuradoria Europeia em vez da primeira classificada, Ana Carla Almeida, que tinha investigado as trafulhices do PS na Protecção Civil. Foi o despedimento de Vítor Caldeira do Tribunal de Contas, depois deste ter criticado a forma como o governo quer gastar a bazuca europeia. Agora isto. 

Como é sabido, António Costa tem uma boa relação pessoal com o húngaro Viktor Mihály Orbán. Isso é bom. As pessoas darem-se bem é bom. Mas já não é bom o primeiro-ministro português estar a imitar políticas musculadas à moda do autocrata húngaro. 


“Cá dentro inquietação, inquietação.” 

Vai continuar a tocar por aqui esta canção sublime de José Mário Branco.

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