A mulher da loja em frente

Fotografia de Victoria Strukovskaya

A mulher da loja em frente traz consigo
algo das antigas deusas. Das possuídas
sibilas. E, com seu olhar flamejante
senta-se num banco esconso, como

quem ordena o mundo: quinquilharia,
pedaços pintados de moluscos, lascas
envernizadas de crustáceos. Depois.
Bem... depois reforça o ódio que nos tem

com epigramas mal amanhados
num enegrecido papel de embrulho.
Reforça a perigosidade dos poetas
sempre a infectar gentes, ilhas, rotas

ancestrais. E que o bem houvera sim,
na ditadura dos generais, onde a ordem
fora ordem, sem abcessos a estorvar
o destino. Nem o jovem e belo rei,

Constantino, tão jovem e tão rei,
abraçara tal imprudência, quanto
mais este viver com laivos
de altivez e foros de demência.
Victor Oliveira Mateus


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