A tosse da noite
ela dizia: prolongou-se o teu sono
mas em mim a noite solta-se
e sopra sobre o fogo da minha carne.
vem, oh vem.
é comigo o amor e o candeeiro de luz cor do vinho.
comigo o êxtase do momento.
se não vens és cobarde
és recipiente cuja água secou.
vem, vem!
banhei esta tarde de perfumes.
e há em meu peito segredos
que ela te confiará, se tu vieres.
meu peito é prisioneiro. lamenta-se.
vem! nada de estrelas
nos meus domínios, nem de luzes.
vem! a nossa noite é uma outra história
o cume de soberana embriaguez.
inebria-me o orvalho de uma voz
uma voz deslizante como vem a alvorada.
mas eu sou como Antar,
paciente e valoroso na hora da morte.
não concedo o meu beijo à cascata
senão no extremo ponto da sua queda.
quero ser livre.
como a vaga, viver.
como o nauta, fender o rio do silêncio.
viver no seio da tempestade
e do trovão,
errar nas selvas.
partir, quero partir
só, envolto no manto da noite
precedido dos meus pressentimentos.
minha bela, em ti
a violência da água
a humidade do camaleão.
eu, alguns lampejos.
diante do odre de vinho, eu era o desejo,
desejo, doces colóquios, à noite, sob a chuva.
mas em minha alma, matei a noite.
a chispa dos meus sonhos foi-se
sobre o cadáver dos meus sentidos.
deixa-me no sono de inverno
falando à toa como um ébrio morto.
eu fico, deixa-me, na infância do meu sonho ido.
deixa-me detrás da porta aferrolhada.
não, não, não abras.
fugirei se abrires a porta,
fugindo à deriva em imensas florestas.
Hassan Abdullah al-Quraishi
Trad.: Adalberto Alves
Comentários
Enviar um comentário