Uma estação

 

Fotografia de Imogen Cunningham



Esta mulher outrora era feita de carne

sadia e firme: quando esperava um filho

fechava-se, escondida, e murchava sozinha.

Não gostava de se mostrar deformada na rua.

Nas outras ocasiões (era jovem e sem querer

fez muitos filhos) passava na rua

com um andar seguro e sabia gozar cada instante.

Os vestidos são vento nas tardes de Março

e colam-se e ondulam à volta das mulheres que passam.

O seu corpo de mulher movia-se seguro no vento

que se esvaía deixando-o mais forte. Não tinha outro bem

a não ser o corpo, hoje consumido por tantos filhos.


Nas tardes de vento espalha-se um odor de seivas,

o cheiro que tinha em jovem o corpo

por baixo dos vestidos supérfluos. Um sabor a terra molhada

que em Março volta sempre. Na cidade, mesmo onde não há avenidas

e nem chega com o sol um sopro de vento,

o seu corpo vivia, exalando sucos

fermentados, entre muros de pedra. Com os anos também ela,

que alimentou outros corpos, se quebrou e dobrou.

Não é bonito vê-la, perdeu toda a força;

mas, dos muitos, uma filha volta a passar

nas ruas, à tarde, e a ostentar ao vento

sob as árvores, sadio e firme, o seu corpo que vive.


E há um filho que deambula e sabe estar sozinho

e sabe divertir-se sozinho. Mas olha-se nas montras,

satisfeito com a maneira como leva pelo braço

a companheira. Gosta, com um jeito dos músculos,

de a puxar para si e que ela resista e de a beijar no pescoço.

Gosta sobretudo, depois de gerar naquele corpo,

de o deixar murchar e voltar a estar sozinho.

Um abraço fá-lo unicamente sorrir e um filho

irritá-lo-ia. Sabe-o a rapariga e espera,

e prepara-se para esconder o ventre deformado

e entrega-se-lhe, complacente, e admira a força

daquele corpo que serve para fazer tantas outras coisas.

Cesare Pavese

Trad.: Carlos Leite



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