Cantoria
Fala a voz dos anjos cantores em Florença.
Eles sustêm na última nota da voz o vazio,
enquanto nos frescos do alto voam serafins
e ante nós cresce como um símbolo a acha
de armas, a procissão breve dos anos.
Antecipam o juízo na cauda dos cometas,
rumores de batalhas, cavalos domando
os chãos de silêncio onde nos deitamos,
ovelhas de alma dispersa e faces aquietadas
ante o discurso longo do sono.
Cantam as pazes da alma indestrutível
iluminando a noite de archotes com a graça
das palavras, a sua e nossa compaixão.
Esses campos de solidão medieval
que se demoram, reflectindo o transepto
das catedrais, na bênção da primeira neve.
Sobre eles desce a perfeição dos plainos da Flandres,
a vaidade de um último olhar. Que o chão
nos sobreviva, górgonas, e a funda voz do heraldo
desenhando cúmulos com os dedos no horizonte.
Paulo Teixeira
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