A limpeza das mãos

* Texto publicado no Jornal do Centro há exactamente dez anos, em 7 de outubro de 2011


O cardeal patriarca de Lisboa, numa recente entrevista ao Jornal de Notícias, afirmou que ninguém sai da política “com as mãos limpas”. 

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Esta generalização de D. José Policarpo teve muito impacto nas redes sociais. Ferveram comentários no Facebook e no Twitter. As pessoas saltaram com rapidez do tópico “mãos limpas” para o tópico “bolsos cheios”. Dos políticos, claro.

Ao não distinguir os políticos sérios dos políticos corruptos, D. José Policarpo fez-lhes o que Simon de Monfort fazia aos cátaros no século XIII quando gritava para os seus soldados: “Matai-os a todos, Deus reconhecerá os Dele!” 

Convém lembrar que ter “as mãos limpas” não é necessariamente bom, ter “as mãos sujas” não é necessariamente mau.

Simpatiza-se com “as mãos sujas” que enformam o barro negro de Molelos, não se simpatiza com “as mãos limpas” que assinaram o contrato dos contentores de Alcântara. 

Simpatiza-se com “as mãos sujas” que cortam os cachos nas encostas do Dão, não se simpatiza com “as mãos limpas” das negociatas do BPN.

Pode-se invadir o “terreno” de D. José Policarpo e lembrar que mais valia que Pilatos tivesse ficado com as mão sujas e não as tivesse lavado como é contado nos evangelhos.

Em 1948, Jean-Paul Sartre escreveu “As Mão Sujas” e é pena ele estar agora fora de moda e ninguém levar essa peça à cena. Sentados no teatro, podíamos talvez perceber melhor a matriz sartriana deste pensamento do patriarca de Lisboa.

Uma coisa é certa: é bom que a afirmação de D. José Policarpo não afaste ainda mais as pessoas da política. É que quanto mais cidadãos “sujarem as mãos” na política mais esta poderá ser limpa.

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