O acaso *

* Texto publicado há exactamente dez anos no Jornal do Centro, em 15 de Julho de 2011


Como escreveram Michael Hardt e Toni Negri em “Império”, o pesadelo nazi pode resumir-se a dois nomes: “Auschwitz (símbolo do holocausto judeu) e Buchenwald (símbolo do extermínio dos comunistas, dos homossexuais e dos ciganos, entre outros).”

Buchenwald é menos falado que Auschwitz mas foi a outra face da máquina de morte alemã. Dois sobreviventes de Buchenwald foram muito falados recentemente nos media: Jorge Semprún e Stéphane Hessel. 


Semprún aderiu à resistência contra os nazis aos 17 anos. Aos 20 foi preso, foi torturado e deportado para Buchenwald. Aí, quem lhe preencheu a ficha ouviu mal e, em vez de escrever “estudante” na profissão, escreveu “estucador”. Em Buchenwald sobravam estudantes, faltavam estucadores. Esse engano salvou-o de morte certa. Foi libertado pele e osso aos 22 anos, em 1945.
     

Depois da guerra, Semprún foi militante comunista clandestino na Espanha franquista, rompeu com o comunismo, foi ministro, escritor, um homem notável amante da liberdade. Morreu há pouco mais de um mês, em 7 de Junho.



Stéphane Hessel faz 94 anos em Outubro e é também uma personalidade fascinante, um homem da liberdade. Aos 22 anos começou a lutar contra Hitler, primeiro no exército francês, depois na resistência. Foi preso, sofreu tal como Semprún a “tortura da banheira”. Em Buchenwald, safou-se porque a sua identidade foi trocada pela de um prisioneiro que tinha morrido com tifo.
    

Em 1948, Stéphane Hessel foi um dos redactores da Declaração Universal dos Direitos dos Homens. O seu recente livro “Indignai-vos” é uma inspiração por essa Europa fora: o movimento dos “Indignados” que ocupou as praças espanholas esta primavera foi buscar a sua designação ao livro de Stéphane Hessel.     

Dois homens que os fios precários do acaso salvaram em Buchenwald. Como se o acaso, ao menos ele..., conhecesse o génio.

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