As minhas ideias têm ideias próprias
As minhas ideias têm ideias próprias. Há muito
que é assim. Desde que perdi o coração, triturado
por uma máquina de fazer dias sem remorso
nem consideração pelas fragilidades que inventaram
o cristal e os versos. Tenho a língua coberta de musgo
e raiva, tenho uma moeda na algibeira e não telefono
nem ao Céu nem ao mar. Vou tendo mulheres
mas só dos olhos para fora. Sonho em matar
o tempo e caio para trás à beira do precipício
de todas as contingências. Como. Como-me.
Sozinho com as estrelas sem luz ou ainda tão distante
que só alumia o passado. Há-de haver um verbo
para isto. Desconheço-o. Desrecordo-o. Hoje
é dia de festa. Festa de São Miguel da Desorientação.
O Diabo mostra a sua cara no sono das crianças
e na falsa simplicidade dos frutos. As minhas ideias
impedem-me de estar presente. Logo hoje
que tanto queria dançar a vida numa malga de vinho.
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