I never kept sheep / Eu nunca guardei rebanhos / Despedida do verão
Fotografia de Mohamad Babayan |
I never kept sheep,
But it’s as if I had.
My soul is like a shepherd,
It knows the wind and the sun
And walks hand in hand with the Seasons,
Following and looking.
All the peace of peopleless Nature
Comes to sit by my side.
But I feel as sad as a sunset is
To our imagination,
When we see it fading in the distance
And feel the night enter
Like a butterfly through the open window.
But my sadness is soothing
Because it’s natural and right
And is what should be there in the soul
When it already thinks it exists
And our hands pick flowers without the soul even noticing.
With a clanking of sheep bells
Beyond the bend in the road,
My thoughts are contented.
I’m only sorry to know they’re contented,
Because if I didn’t know that,
Instead of being contented and sad,
They would be joyful and contented.
Thinking is as unpleasant as walking in the rain
When the wind builds and makes the rain seem heavier.
I have no ambitions or desires.
Being a poet is not my ambition.
It’s my way of being alone.
And if sometimes I want,
In my imagination, to be a little lamb
(Or to be the whole flock
And wander over the entire hillside
And be many happy things at the same time),
It’s only because I feel what I write at sunset,
Or when a cloud passes a hand over the light
And a silence runs away through the grass.
When I sit down to write verses
Or, when, walking the paths or trails,
I write verses on a piece of paper in my mind,
I feel a shepherd’s crook in my hand
And I see another me
On top of a hill,
Looking down at my flock and seeing my ideas,
Or looking down at my ideas and seeing my flock,
And smiling vaguely like someone who hasn’t understood what was said
But pretends that he has.
I salute all those who’ll read me,
Taking off my broad-brimmed hat to them
When they see me at my door
As their carriage appears over the hill.
I salute them and wish them sun,
And rain, when rain is needed,
And for their houses to have,
Next to an open window,
A favorite chair
Where they sit, reading my verses.
And that when they read my verses they will think
That I am some natural thing—
For example, the ancient tree
In whose shade, when they were children,
They would flop down, weary with playing,
And wipe the sweat from their hot brow
With the sleeve of their striped smock.
Alberto Caeiro
Translated by
Margaret Jull Costa
& Patricio Ferrari
Eu nunca guardei rebanhos,
Mas é como se os guardasse.
Minha alma é como um pastor,
Conhece o vento e o sol
E anda pela mão das Estacões
A seguir e a olhar.
Toda a paz da Natureza sem gente
Vem sentar-se a meu lado.
Mas eu fico triste como um pôr do Sol
Para a nossa imaginação,
Quando esfria no fundo da planície
E se sente a noite entrada
Como uma borboleta pela janela.
Mas a minha tristeza é sossego
Porque é natural e justa
E é o que deve estar na alma
Quando já pensa que existe
E as mãos colhem flores sem ela dar por isso.
Com um ruído de chocalhos
Para além da curva da estrada,
Os meus pensamentos são contentes.
Só tenho pena de saber que eles são contentes,
Porque, se o não soubesse,
Em vez de serem contentes e tristes,
Seriam alegres e contentes.
Pensar incomoda como andar à chuva
Quando o vento cresce e parece que chove mais.
Não tenho ambições nem desejos.
Ser poeta não é uma ambição minha.
É a minha maneira de estar sozinho.
E se desejo às vezes,
Por imaginar, ser cordeirinho
(Ou ser o rebanho todo
Para andar espalhado por toda a encosta
A ser muita coisa feliz ao mesmo tempo),
É só porque sinto o que escrevo ao pôr do Sol
Ou quando uma nuvem passa a mão por cima da luz
E corre um silêncio pela erva fora.
Quando me sento a escrever versos
Ou, passeando pelos caminhos ou pelos atalhos,
Escrevo versos num papel que está no meu pensamento,
Sinto um cajado nas mãos
E vejo um recorte de mim
No cimo dum outeiro,
Olhando para o meu rebanho e vendo as minhas ideias,
Ou olhando para as minhas ideias e vendo o meu rebanho,
E sorrindo vagamente como quem não compreende o que se diz
E quer fingir que compreende.
Saúdo todos os que me lerem,
Tirando-lhes o chapéu largo
Quando me vêem à minha porta
Mal a diligência levanta no cimo do outeiro.
Saúdo-os e desejo-lhes sol
E chuva, quando a chuva é precisa,
E que as suas casas tenham
Ao pé duma janela aberta
Uma cadeira predilecta
Onde se sentem, lendo os meus versos.
E ao lerem os meus versos pensem
Que sou qualquer coisa natural —
Por exemplo, a árvore antiga
À sombra da qual quando crianças
Se sentavam com um baque, cansados de brincar,
E limpavam o suor da testa quente
Com a manga do bibe riscado.
Alberto Caeiro
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