À Fortuna


Fortuna, que me persegues,
Pequeno triunfo tens:
Eu desejo só vontades,
Tu disputas-me vinténs.
Basta-me o que me deixares,
Quando tudo me levares.

Basta-me esta alma que tenho,
Constante como os penedos;
Bastam-me as águas das fontes,
E a sombra dos arvoredos;
Ponho-me ao fresco no Estio,
E aquento-me, andando ao frio.

Basta-me o Sol, que não podes
Apagar, e à noite a Lua.
Se me tirares a casa,
Irei dormir para a rua.
Sopa, não me dá cuidado,
Tem muitas plantas o prado.

Se o teu rigor se estendesse
A tirar-me o meu tinteiro,
Escreveria nos troncos,
Com um prego, este letreiro:
«Vim ao mundo sem camisa,
Ninguém, morrendo, a precisa.»

                                                                           Marquesa de Alorna


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