Religiões

* Texto publicado no Jornal do Centro há exactamente dez anos, em 5 de Dezembro de 2014


1. No outono de 2013, o padre Albino Reis, reitor do Santuário de Nossa Senhora de Muxima, o maior de Angola, apelidou de "fanáticos religiosos" o grupo de seguidores da Igreja Arca de Noé que irrompeu em plena missa e atacou à paulada a imagem de Mamã Muxima.

Fotografia de José Coelho (daqui) 
Neste outono, o padre Albino Reis, por quatro vezes, depois de celebrar missa na paróquia de Canelas (Vila Nova de Gaia), teve que atravessar, protegido pela GNR, uma multidão furibunda que quer o anterior pároco de volta.

Ao contrário do seu homónimo angolano, Albino Reis não diz nada contra aquela turbamulta. Na última missa, durante o "Pai-Nosso", em vez de «livrai-nos de todo o mal», pediu-Lhe: «livrai-nos de toda a perturbação».

E a perturbação há-de passar. Movimentações deste tipo nas paróquias, alimentadas ou não pelos padres de saída, não são coisa rara. A diocese de Viseu teve, há três anos, um episódio parecido em Queirã (Vouzela). O povo costuma fazer o clássico abaixo-assinado. O de Canelas foi subscrito por 5800 dos seus 13 459 habitantes. Depois, com maior ou menor dificuldade, a vontade da hierarquia acaba por prevalecer.

2. Como explica Moisés Naím em "O Fim do Poder", o enfraquecimento geral das grandes organizações centralistas atinge os estados, as empresas, os partidos, os exércitos, ..., e atinge também as religiões.

A imposição, de cima para baixo, da vontade das hierarquias será cada vez mais difícil. A reacção violenta em Canelas é só um sinal dos tempos. Também no "mercado das almas" a concorrência é cada vez maior. As igrejas pentecostais e evangélicas, que têm hierarquias light e decisão descentralizada, que partem da auto-organização dos fiéis e sabem utilizar com agilidade os novos media, estão em grande crescimento.

O papa Francisco — apesar de ser agora, no sistema mediático global, o que Obama foi em 2008 — não vai conseguir inverter esta erosão do centralismo católico.

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