Matrioscas de caras*
* Hoje no Jornal do Centro
Vídeo e podcast aqui
A paisagem humana mudou. Já não é carnaval, mas ninguém leva a mal por ainda andarmos mascarados. Toda a gente agora precisa de máscara e temos de aprender a reconhecermo-nos uns aos outros só através dos olhos.
No mercado dos afectos, uns olhos bonitos agora fazem toda a diferença. O nariz, o desenho da boca, os dentes, já não são tão importantes. Há um meme que circula nas redes sociais que explica muito bem este “novo normal”. É um casal de namorados num banco de jardim; ele para ela: «mostra-me o nariz»; ela para ele: «só depois de casarmos».
As máscaras são um mercado imenso. Vão dar muito dinheiro. O bicho corono conseguiu aquilo que os barbudos aiatolas nunca conseguiram. Chusmas de empreendedoristas (como se diz em economês), resmas de trafulhas, nuvens de criativos, está tudo na corrida para nos tapar a cara.
A designer Danielle Baskin, de San Francisco, criou uma linha de máscaras N95 em que se pode imprimir o nariz, a boca e o queixo do proprietário. É à vontade do freguês. Esta máscara é uma cara sobre a cara. Se se fizer uma com cara a rir, e outra com cara séria, podemos alterná-las conforme o estado de espírito. Ou pôr uma sobre a outra, uma matriosca de caras. Espero ter explicado a ideia.
Se pusesse aqui um gif da Danielle a tirar a cara da Danielle de cima da cara da Danielle, era mais fácil e este parágrafo ficava bem mais pequeno.
Ao ver esta história lembrei-me da bancarrota da Argentina de 2001. Em 30 de Novembro daquele ano, o ministro da economia Domingo Cavallo decretou o corralito que congelou as contas bancárias. As pessoas ficaram sem acesso ao seu dinheiro. Em fúria, milhares e milhares de argentinos vieram para as ruas com uma máscara do odiado ministro e a baterem em panelas — o carecolazo -, uma tradição da política latino-americana. Houve tiros. Mortes. Pilhagens. Caos.
A 19 de Dezembro teve que ser declarado o estado de sítio. A multidão mascarada e de caçarolas na mão cercou a casa de Cavallo. Reza a lenda que o ministro só conseguiu escapulir-se pelo meio daquela turba porque levava posta uma das populares máscaras de si próprio.
A paisagem humana mudou. Já não é carnaval, mas ninguém leva a mal por ainda andarmos mascarados. Toda a gente agora precisa de máscara e temos de aprender a reconhecermo-nos uns aos outros só através dos olhos.
No mercado dos afectos, uns olhos bonitos agora fazem toda a diferença. O nariz, o desenho da boca, os dentes, já não são tão importantes. Há um meme que circula nas redes sociais que explica muito bem este “novo normal”. É um casal de namorados num banco de jardim; ele para ela: «mostra-me o nariz»; ela para ele: «só depois de casarmos».
As máscaras são um mercado imenso. Vão dar muito dinheiro. O bicho corono conseguiu aquilo que os barbudos aiatolas nunca conseguiram. Chusmas de empreendedoristas (como se diz em economês), resmas de trafulhas, nuvens de criativos, está tudo na corrida para nos tapar a cara.
A designer Danielle Baskin, de San Francisco, criou uma linha de máscaras N95 em que se pode imprimir o nariz, a boca e o queixo do proprietário. É à vontade do freguês. Esta máscara é uma cara sobre a cara. Se se fizer uma com cara a rir, e outra com cara séria, podemos alterná-las conforme o estado de espírito. Ou pôr uma sobre a outra, uma matriosca de caras. Espero ter explicado a ideia.
Se pusesse aqui um gif da Danielle a tirar a cara da Danielle de cima da cara da Danielle, era mais fácil e este parágrafo ficava bem mais pequeno.
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Ao ver esta história lembrei-me da bancarrota da Argentina de 2001. Em 30 de Novembro daquele ano, o ministro da economia Domingo Cavallo decretou o corralito que congelou as contas bancárias. As pessoas ficaram sem acesso ao seu dinheiro. Em fúria, milhares e milhares de argentinos vieram para as ruas com uma máscara do odiado ministro e a baterem em panelas — o carecolazo -, uma tradição da política latino-americana. Houve tiros. Mortes. Pilhagens. Caos.
A 19 de Dezembro teve que ser declarado o estado de sítio. A multidão mascarada e de caçarolas na mão cercou a casa de Cavallo. Reza a lenda que o ministro só conseguiu escapulir-se pelo meio daquela turba porque levava posta uma das populares máscaras de si próprio.
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