Imagens e palavras*
* Texto publicado no Jornal do Centro há exactamente dez anos, em 28 de Fevereiro de 2013
Costuma-se dizer que “uma imagem vale mais que mil palavras” mas, se “Guernica” de Pablo Picasso deu origem a uma enorme biblioteca, já os milhões de fotografias de comida publicadas diariamente no Instagram, em vez de mil palavras, suscitam só uma: “braagghhhh!”
“Uma imagem vale mais que mil palavras” será uma síntese que não acredita no espírito de síntese? Uma comparação de poder? Não parece. Tanto há imagens poderosas como não. O mesmo com as palavras.
Imagens ou palavras são ideias que se consumam dentro da cabeça. “Ver” uma imagem é ter um pensamento sobre ela, e esse pensamento não existe sem palavras, o processamento de ideias dentro do nosso cérebro não se faz com bits, faz-se com palavras. Daí decorre que, quem tiver mais vocabulário, tem necessariamente mais ideias.
É por isso que o eduquês, ao fugir dos autores clássicos, ao procurar nas aulas uma linguagem similar à dos alunos, retira-lhes vocabulário, estreita-lhes o seu mundo interior, diminui-lhes a possibilidade de gerarem ideias.
Um parêntesis para dizer do meu desapontamento com a incapacidade do actual ministro em combater o eduquês. Nuno Crato, ao contrário do que sempre escreveu e teorizou, chegado ao governo, em vez de focar as escolas no “produto” (os conteúdos que os alunos têm que aprender), fá-las gastar cada vez mais energias no “processo” (burocracia, centralismo, nevoeiro regulamentar).
Mas regresse-se à dialética imagem-palavra: um dos cartazes do filme galego “Crebinsky” (com recente estreia nacional na Acert e no Cine Clube de Viseu) mostra uma “vaca com periscópio” ou, dito de outra forma, um “submarino com tetas”.
“Submarino com tetas”, três palavras somente, mas — como “as palavras são como as cerejas” - podem chegar às mil palavras, às mil ideias, às mil milhões, aos submarinos, ao mais célebre militante do CDS: Jacinto Leite Capelo Rego.
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