Avental *
* Texto publicado no Jornal do Centro há exactamente dez anos, em 20 de Janeiro de 2012
Em 1995 o país olhava com esperança para o futuro. O foco da atenção dos portugueses estava virado para António Guterres, o último primeiro-ministro que governou para as pessoas e não para os banqueiros e a grande advocacia dos negócios.
1995 foi o ano glorioso em que a EDP abaixou as orelhas em Foz Côa. Naquela época era inimaginável que viríamos a assistir, poucos anos depois, a um chefe de governo socialista, parolo no seu atavio Hugo Boss, a dizer ao presidente da EDP «agora só falta aqui é cimento!» E dizer isto em pleno vale do Tua, vale magnífico na sua aspereza, último santuário de um Portugal que merecia outras elites menos bárbaras.
No outono daquele ano de 1995, Jorge Sampaio começou a sua campanha para as presidenciais, campanha sem grande sobressaltos que, como era então da praxe, teve entrevista na RTP feita por Maria Elisa.
A conversa decorreu meia sonolenta pois, como é sabido, Jorge Sampaio é mais acutilante em inglês do que em português. Eis senão quando, já no final da entrevista, Maria Elisa virou-se para Sampaio e disparou: «acredita em Deus?» ao que ele replicou seco: «não.»
Na altura, aquela pergunta caiu mal ao país político. Assuntos de fé são, na nossa terceira república, assuntos do foro individual. Desde o 25 de Abril tem-se sabido evitar querelas religiosas como as que se viveram entre 1910 e 1926. E isso é muito bom.
Tenho-me lembrado muito daquela pergunta de Maria Elisa a Jorge Sampaio desde que tomei conhecimento do triângulo mafioso Maçonaria-SIS-Ongoing.
Penso que, mesmo depois do que se soube, não é legítimo a um jornalista perguntar: «acredita no Grande Arquitecto?»
Mas penso que todo o jornalista, perante um político que anda a pedir o voto das pessoas, tem o imperativo moral de lhe perguntar: «usa avental?»
Comentários
Enviar um comentário