Águas municipais*
* Texto publicado hoje no Jornal do Centro
1. Foi numa noite escura do Inverno de 1933 que o sr. Percy Shaw teve uma intuição que o ia tornar rico. Ia ele a guiar pelas ruas de Yorkshire quando percebeu que as linhas do eléctrico, iluminadas pelos faróis do seu carro, pareciam olhos de gato a brilhar na escuridão e que aquele brilho facilitava a condução no nevoeiro.
No ano seguinte, o sr. Percy registou a patente dos cravos reflectores no asfalto — a que chamou “olhos de gato” — e tratou de fundar uma empresa para os comercializar.
Esta coluna — que faz este mês quinze anos — nunca pagou direitos de autor ao sr. Percy Shaw pelo uso do nome Olho de Gato mas já prestou várias vezes o merecido tributo a estes simpáticos dispositivos de segurança rodoviária. Sempre que, em Viseu, a câmara procede a uma sementeira de “olhos de gato”, este espaço de opinião sente-se honrado. Homenageado até.
Foi o caso agora. As passadeiras da Circunvalação acabam de receber 296 olhos de gato fotovoltaicos que tremeluzem no chão tanto nos dias claros como nas noites escuras. Lembrando a célebre canção da Ruth Marlene, à ilharga e na vertical de cada passadeira, setenta sinais piscam-piscam à esquerda enquanto outros tantos igualinhos piscam-piscam, redundantes, à direita.
2. Quando criou a empresa Águas de Viseu, António Almeida Henriques abriu a porta à privatização da água no futuro. Foi um erro político muito criticável por duas razões: porque um assunto de tal gravidade não foi tratado na campanha eleitoral que o elegeu e porque os Serviços Municipalizados sempre funcionaram bem e sempre foram auto-sustentáveis.
Este erro deve ser revertido: há que dizer não à privatização da água. Há que regressar aos Serviços Municipalizados. Mais planaltos beirões não, por favor.
1. Foi numa noite escura do Inverno de 1933 que o sr. Percy Shaw teve uma intuição que o ia tornar rico. Ia ele a guiar pelas ruas de Yorkshire quando percebeu que as linhas do eléctrico, iluminadas pelos faróis do seu carro, pareciam olhos de gato a brilhar na escuridão e que aquele brilho facilitava a condução no nevoeiro.
No ano seguinte, o sr. Percy registou a patente dos cravos reflectores no asfalto — a que chamou “olhos de gato” — e tratou de fundar uma empresa para os comercializar.
Esta coluna — que faz este mês quinze anos — nunca pagou direitos de autor ao sr. Percy Shaw pelo uso do nome Olho de Gato mas já prestou várias vezes o merecido tributo a estes simpáticos dispositivos de segurança rodoviária. Sempre que, em Viseu, a câmara procede a uma sementeira de “olhos de gato”, este espaço de opinião sente-se honrado. Homenageado até.
Foi o caso agora. As passadeiras da Circunvalação acabam de receber 296 olhos de gato fotovoltaicos que tremeluzem no chão tanto nos dias claros como nas noites escuras. Lembrando a célebre canção da Ruth Marlene, à ilharga e na vertical de cada passadeira, setenta sinais piscam-piscam à esquerda enquanto outros tantos igualinhos piscam-piscam, redundantes, à direita.
Gif Olho de Gato |
Tudo luminoso, tudo síncrono, os olhos de gato e os sinais, tudo a trabalhar na avisação das passadeiras, abençoados sejam, mesmo que evitem só um atropelamento já é bom.
Este erro deve ser revertido: há que dizer não à privatização da água. Há que regressar aos Serviços Municipalizados. Mais planaltos beirões não, por favor.
"Não hei de morrer sem saber
ResponderEliminarqual a cor da liberdade.”
Jorge de Sena
LUZES
A recente polémica do cancelamento da conferência de Jaime Nogueira Pinto (intitulada “Populismo ou Democracia: O Brexit, Trump e Le Pen”) deixou-me perplexo; ler o artigo de Joaquim Alexandre remeteu-me para as Luzes (Iluministas) seus valores e o meu tempo de liceu fascista (com Mocidade Portuguesa, e tudo…).
Na verdade, quando vinte e quatro alunos numa RGA (Faculdade de Ciências Sociais e Humanas) votam favoravelmente uma moção que exigia o cancelamento da conferência de Jaime Nogueira Pinto, devemos questionar como pode um grupo minoritário e radical ter força suficiente para calar um conferencista, com opiniões antagónicas às minhas, que considero bafientas, mas que foi um facto que não me deixou indiferente. Não entendi! Não percebi! Não compreendo!
Felizmente que tive um excelente professor de Filosofia que muito nos “massacrou” com o Voltaire, Pascal, Montesquieu, Diderot, Rousseau…, e os seus ideais. Arriscou, pois estávamos no tempo do “Liceu do sr Reitor”, e os valores da livre discussão e liberdade de expressão estavam proibidos. Não mais esquecemos a frase escrita no quadro negro: "Não concordo com o que dizes, mas defenderei até à morte o teu direito a dizê-lo”, da escritora britânica Evelyn Beatrice Hall (embora atribuída a Voltaire). Não mais esquecemos a lição de John Stuart Mill: “Silenciar uma opinião é roubar a humanidade do seu mais valioso património, pois se essa opinião estiver certa perdemos uma oportunidade de corrigir a nossa própria opinião, e se essa opinião estiver errada perdemos uma oportunidade de denunciar a sua falsidade.”
Não me identifico com os ideais de Rafael Pinto Borges, um dos promotores do grupo Nova Portugalidade, responsável pela organização da conferência que assume: “Eu sinto estima pessoal, política e intelectual por Salazar” e não partilho do passado de direita radical de Jaime Nogueira Pinto. Por tudo isso, não esqueço o ambiente estudantil difícil, de Coimbra, antes do glorioso 25. Nos anos 70, a direita estudantil coimbrã tinha locais de culto e de organização, tais como a denominada Cooperativa Livreira Cidadela, na rua Alexandre Herculano, quase a chegar à Praça da República, da autoria do grupo nacional-revolucionário da Faculdade de Direito, chefiado por José Miguel Júdice. A este se juntavam mais dois organismos (Orfeon e OTUC - Oficina de Teatro da Universidade de Coimbra) tradicionalmente controlados pela direita, que constituirão os três pilares de acção dos nacionalistas em Coimbra.
Com 17/18 anos, ter o baptismo político significava acompanhar e ouvir as discussões políticas dos irmãos mais velhos, com os seus amigos e amigas, na Praça da República; significava poder frequentar (sempre) o Café Tropical ou eventualmente o Moçambique, o Piolho ou a Clepsidra, na Praça da República. No Café Tropical era fácil encontrar os “duros dinossauros” resistentes Orlando de Carvalho, Joaquim Namorado (meu professor de Matemática) ou Louzã Henriques, entre outros. Todos sabíamos da presença da PIDE, e jovens ainda não comprometidos com uma verdadeira acção antifascista, receavam muito mais do que aqueles que já lutavam contra o regime.
Concluindo, o que irrita mesmo é que agora abriram as portas e os tempos de antena à extrema-direita de retórica neonazi.
E voltamos a ter na Memória que os valores da tolerância e liberdade de expressão nunca estão adquiridos, são uma luta perpétua.