Biopolítica*

* Hoje no Jornal do Centro


1. Nos tempos que correm, uma boa parte dos assuntos da agenda mediática e política têm a ver com o corpo. São assuntos de biopolítica.

São as imposições alimentares, que tanto passam pela redução do sal e do açúcar como pelo crescente activismo veg que se vai radicalizar e tornar agressivo.

É, até, a construção do corpo dos políticos e a afirmação descomplexada das suas sexualidades: os peitorais de um deputado laranja, a tatuagem de uma deputada rosa que está no Tinder, a saída do armário da ministra da cultura e de um vice-presidente do CDS. E a este panorama só não se junta José Castelo Branco porque ele desistiu de ser candidato.

Atenção: este hedonismo corporal curte metodicamente o presente mas vive cheio de angústias com o futuro. As pessoas esculpem abdominais no ginásio enquanto vigiam o colesterol, fazem selfies à frente de sítios distantes a que chegaram com uma grande pegada de carbono enquanto se afligem com as catástrofes ecológicas, reais ou imaginárias, anunciadas todos os dias nos media e nas redes sociais.

2. Uma boa parte da direita na Europa, inspirada no papa Francisco e com uma pulsão anti-islâmica, assumiu o combate biopolítico contra as elites da globalização. Rejeita a UE, o casamento do mesmo sexo, os migrantes, os mercados desregulados, a austeridade, o consumismo e as GAFA (Google, Amazon, Facebook, Apple).

A direita está cada vez mais desconfortável com os valores cosmopolitas das grandes cidades e vai-se ruralizando. Algumas minorias, em coerência, abandonam as metrópoles e optam por uma agenda ecológica agressiva, instalando-se em pequenas comunidades com famílias e modos de vida tradicionais.

Por cá, a reacção do CDS e do PSD à lei da identidade de género nas escolas parece indicar que acordaram para estas querelas do corpo, onde o bloco e a ala esquerda do PS têm pontificado sem contraditório.

Com o atraso pátrio do costume, também entre nós a biopolítica vai passar a ser muito mais dura.

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