Pára para tempo
Daqui |
VII
Uma bailarina curva. Vagamente inclinada sobre a sua presença. Fecha os olhos como se. Estica os braços. Abre as mãos para nada. Quer suicidar-se no espanto.
As coisas caem naturalmente. Cair é natural.
Em pontas, o desespero da gravidade é o cenário do palco. O sangue atingindo vermelho os dedos exaustos.
Há muito que deixou de dançar. Naturalmente. Demente mulher de sal.
O movimento é apenas o comércio da música com o corpo. Uma troca de elementos insolúveis em si. Diluição do corpo na matéria-prima do álcool. Desfazer-se dentro.
Ela precisa de si e si não é nada. Si é um erro. Si é uma pobre ilusão num teatro assombrado. Um fantasma. É uma réplica mal executada de uma estátua divina. Si morre.
E num ponto ridículo do palco, a bailarina desaparece lentamente. Desaparece a partir do cabelo onde nunca foi colocada a flor da glória. Desaparece nua, sem nada, sem sequer a morte que lhe podia ter permitido a existência.
Poro a poro, irrisória, a bailarina deixou de viver.
As coisas morrem naturalmente. Morrer é natural.
Patrícia Baltazar
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