Progresso *
* Texto publicado hoje no Jornal do Centro
1. Este texto tem três fontes: (i) um conjunto de fotografias extraordinárias de Paula Magalhães e Fernando Rodrigues sobre dois bairros de pobres de Viseu: o Bairro de Santiago e o Bairro da Cadeia; (ii) uma análise do Bairro da Cadeia feita em 2003 por David Ferreira; (iii) uma recensão sobre o último livro de John Gray, “The Silence of Animals: On Progress and Other Modern Myths” que põe em causa a ideia do “progresso”.
Os cristãos, na ofensiva, eram o novo, e o novo, quando substitui o velho, é bárbaro. A certa altura, na tentativa de evitar males maiores, aconselham a grande mulher:
«Converte-te, Hypatia, senão Cyril ganha...»
«Ele já ganhou...», respondeu ela, realista.
Não há nada que sobreviva às acções destrutivas da barbárie do novo e do tempo. Como sabia Hypatia, «ele já ganhou». Ele, aquilo a que se chama progresso. O novo substitui o velho. E o devir implacável do tempo arruina o novo e o velho. A barbárie e o tempo ganham sempre. E só há duas maneiras de lhes atardar a vitória — através da memória e do trabalho. Lembrar e trabalhar são o calhau que o homem/Sísifo está condenado a arrastar pelo monte do tempo acima.
Há ideias de se preservar, no Bairro da Cadeia, algum deste Portugal dos Pobres numa espécie de Portugal dos Pequeninos. Seja. Nada contra.
2. A câmara de Viseu calendarizou o “I Festival de Jazz de Viseu” para os exactos dias do “Tom de Festa” em Tondela. Tenho a certeza que no futuro, seja com José Junqueiro seja com Almeida Henriques, tal estupidez não se torna a repetir.
Bairro de Santiago (fotografia de Paula Magalhães)
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A acção do filme “Ágora”, de Alejandro Amenábar, passa-se no século IV no Egipto então dominado por Roma, e tem como pano de fundo a luta entre o saber politeísta defendido pela filósofa Hypatia, guardado em rolos na Biblioteca de Alexandria, e o saber monoteísta cristão, liderado por Cyril, guardado no livro sagrado.Os cristãos, na ofensiva, eram o novo, e o novo, quando substitui o velho, é bárbaro. A certa altura, na tentativa de evitar males maiores, aconselham a grande mulher:
«Converte-te, Hypatia, senão Cyril ganha...»
«Ele já ganhou...», respondeu ela, realista.
Não há nada que sobreviva às acções destrutivas da barbárie do novo e do tempo. Como sabia Hypatia, «ele já ganhou». Ele, aquilo a que se chama progresso. O novo substitui o velho. E o devir implacável do tempo arruina o novo e o velho. A barbárie e o tempo ganham sempre. E só há duas maneiras de lhes atardar a vitória — através da memória e do trabalho. Lembrar e trabalhar são o calhau que o homem/Sísifo está condenado a arrastar pelo monte do tempo acima.
Bairro da Cadeia (fotografia de Fernando Rodrigues) |
2. A câmara de Viseu calendarizou o “I Festival de Jazz de Viseu” para os exactos dias do “Tom de Festa” em Tondela. Tenho a certeza que no futuro, seja com José Junqueiro seja com Almeida Henriques, tal estupidez não se torna a repetir.
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