A Europa e a “Europa”
* Texto publicado no Jornal do Centro há exactamente dez anos, em 30 de setembro de 2011
1. Em 2004, George Steiner proferiu uma palestra intitulada A Ideia da Europa — editada entre nós pela Gradiva — em que apontou cinco especificidades da consciência europeia:
(i) o café — “local de entrevistas e conspirações, debates intelectuais e mexericos”, os cafés são coisa europeia e neles se fez muito da sua história;
(ii) a escala humana — a Europa foi sempre percorrida a pé, tanto pelos peregrinos como pela longa marcha dos exércitos, os de Napoleão foram “de Portugal a Moscovo”;
(iii) a memória — a presença constante do passado nas placas das ruas e das praças, com os nomes dos homens e das mulheres ilustres, mas também com a evocação das tragédias;
(iv) a “herança dupla de Atenas e de Jerusalém” – Heraclito e Espinoza. Platão e Karl Marx. George Steiner afirma: “o cristianismo e o socialismo utópico são descendentes do Sinai”;
(v) a consciência do fim — o cristianismo sempre elaborou sobre o juízo final.
O livro, de uma erudição espantosa, termina com uma nota de esperança e um apelo para que tenhamos uma vida reflectida.
Recomenda-se. A recomendação inclui o prefácio de Durão Barroso.
2. Aqui nunca se confunde a Europa (o continente) com a “Europa” (a União Europeia). A “Europa” — o “primeiro estado pós-moderno”, como diz Robert Kagan — proporcionou-nos sessenta e seis anos consecutivos de paz e progresso.
Esta semana, em Paris, Lula fez um apelo para ser ouvido em todo o mundo: "a União Europeia é uma criação muito importante, é um património da humanidade, salvem-na!"
Há que a salvar. Para isso, nestes tempos de emergência, há que fazer uma dupla exigência aos políticos europeus :
— não tenham medo da voz democrática dos povos, a “Europa” é dos cidadãos, não é dos bancos;
— as poupanças das pessoas têm que ser garantidas, o capital financeiro não.
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