Acrilírico

Fotografia de Hans Feurer




as suas ágeis mãos sonharam tempo
quase entre os meus recados, os secretos
canais onde altos barcos, a
brancura,
sabia o som das vozes imortais.
juntou-me ao seu cabelo, à sua audaz
mudança de memória.
agora encosto os cantos nas esquinas
na prata enevoada dos seus dedos.
já me esqueci? não sei se me persiste
um duro chão, a escada
redonda onde nasci,
a breve idade.
estou no vento que escorre as suas águas
na barreira de incesto que nos move.
em suas mãos dissimulado
avança, entre clareiras, o roteiro
de nossas mansas aves.
aceito a sua água, o seu retrato
junto à ponte, no meio
de inúteis castiçais.
ouço-a, de noite, sussurrar as penas
que a língua não consente.


é o seu bafo que me aquece
as brilhantes retortas
o doce candelabro.
eis a sua pálida figura, o seu retrato
a giz nos vastos
armazéns do império.
és este cuspo de óleo, este ligeiro
verso da lembrança.
ou ficará de mim esse outro rastro?
no resto dos seus olhos
pousarei o lençol, lembrando
o ângulo das chuvas, e os brandos
meteoros.
passeio-me
de tranças, com um fio
azul por entre as franjas
flexíveis da memória.
encontro esse motivo nos teus dedos,
na sua carne de curtume branco.
deixa que viva nos seus olhos, rosto.
entornou-se no vento foi delgada
como as ruínas de uma
breve espera.
António Franco Alexandre


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