O estado *

* Texto publicado no Jornal do Centro há exactamente quatro anos, em 12 de Março de 2010



1. O sismo de 27 de Fevereiro atingiu fortemente Concepción, uma cidade chilena de quase um milhão de pessoas. Seguiram-se vários dias terríveis de pilhagens e vandalismo que levaram à formação de milícias e a episódios de justiça sumária. Quando foi possível mandar o exército em força para a região, decretou-se um severo recolher obrigatório de 18 horas.

Estes factos graves passados agora no Chile repetem-se sempre em iguais circunstâncias em todas as latitudes e longitudes. Fazem parte daquilo a que se costuma chamar a “natureza humana”. A ordem que faz funcionar as nossas sociedades não é uma ordem natural, é um verniz muito fino e que começa a estalar logo às primeiras adversidades.

Como há muito tempo nos dizem a religião, a literatura e a ciência, para nos podermos amar uns aos outros tem que haver um “acima de nós” que tal nos imponha.

Esse “acima de nós” é o estado. E, quanto mais fraco estiver o estado, mais dificuldade teremos em nos amarmos uns aos outros.

2. Foi lançado em Londres o livro “The end of the party”, de Andrew Rawnsley, onde se revela que, por causa da guerra do Iraque, Tony Blair sofreu um acentuado declínio psicológico e físico, e que esteve à beira da depressão. Pensou, até, em demitir-se na primavera de 2004.


Fotografia daqui
À semelhança do que se passa com as pessoas, a guerra do Iraque mostrou que também para os estados se poderem amar uns aos outros é preciso um “acima deles” capaz de os obrigar a isso.

Esse “acima dos estados” chama-se globalização. As instituições internacionais “acima dos estados” têm-se solidificado e vão ter um papel cada vez mais activo.

Já há, até, algum direito penal internacional, embora só para os vencidos. É só por isso que Bush e Blair se safam do banco dos réus. E é pena.

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