Cavacofobias

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Um dos exercícios mais repetidos no nosso espaço público é o "tiro-ao-cavaco".  A seguir a estas declarações do início de 2012...




... o presidente da república nunca mais recuperou popularidade e passou a ser um "saco de boxe".  Até lhe "malham" pelos tropeções na gramática e pelos problemas de saúde. 

Como não gosto de alcateias, nunca mais o critiquei. É de evitar "bater" em quem está por baixo.

Aliás, desde então, Cavaco Silva só tem sido confrontado com coisas de intendência, nada de muito relevante. Todo o bruááá noticioso e comentadeiro à volta do que o PR tem feito não é mais do que espuma em cima de espuma. 

A única situação não espumosa foi a crise da "demissão irrevogável" de Paulo Portas, em Julho de 2013, que ele resolveu de uma forma exemplar e a merecer elogio. Cavaco Silva tentou até dar a mão a Seguro mas aquilo era demasiada areia para a fraquíssima camioneta do então líder do PS.

Depois deste longo intróito, que ainda não é o balanço dos dois mandatos do presidente da república, devo confessar que também já sofri de "cavacofobia". 

O texto de 2002 que se segue — com o título UMA CAVACADA — que penso ter publicado no Diário Regional de Viseu* (agora Diário de Viseu), é um exemplo de "cavacofobia", coisa que agora é uma "epidemia", mas então não era. 

De qualquer forma, estou curado dessa "maleita" e o texto que se segue corresponde só a um achado quase "arqueológico" no meu computador.



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UMA CAVACADA



“Como é que nos vamos livrar deles? Reformá-los não resolve porque deixam de descontar para a Caixa Geral de Aposentações. Só nos resta esperar que acabem por morrer…”
Cavaco Silva, 
Porto, 27 de Fevereiro de 2002


Este “deles”, de que fala Cavaco Silva, são os funcionários públicos.
Falou assim. Desta forma. Nem mais nem menos.

O doutor Cavaco Silva está preocupado com os funcionários públicos.
Quer-se livrar deles.

São demais. Muitos. Uns chatos. Uma maçada.
Estragam as contas públicas, embora descontem para a Caixa Geral de Aposentações.

São um alerta rápido da Comunidade Europeia, são o fim do Aeroporto da Ota, são a suspensão do Instituto Universitário de Viseu**, são uma incineradora dedicada em qualquer ponto do país à excepção de Coimbra ou Setúbal, são uma descida dos Impostos para os mais ricos.
Em suma: os funcionários públicos são uma página menos brilhante numa qualquer autobiografia política.

E depois, douto doutor Cavaco Silva, há uma outra angústia à volta deste problema: qual será a esperança de vida dos funcionários públicos?
Para não falar das funcionárias.
Será que ultrapassam - pela direita e pela esquerda, naturalmente - a esperança média de vida dos portugueses?

Será que Portugal vai precisar de privatizar a Caixa Geral de Depósitos para lhes pagar?
Será necessário abrir um off-shore nas Berlengas? Claro que seria um off-shore com poucos benefícios fiscais, e depois da necessária autorização do Dr. João Jardim da Madeira, esse expoente social-democrata da governação sem défice.

Como resolver este problema magno tão magnificamente identificado por V. Exa.?
Chegará um cartaz com uma criancinha rabina a fazer uma pergunta inteligente: 
“Vovó, porque é que os funcionários públicos não gostam da eutanásia?
Ou outro cartaz, de 8 metros por 3, com um guri, de olho vivo, perguntando: 
“Mamãiee, o Cavaco e o Durão não eram do mesmo governo?”

Assim como assim, e apesar de tudo, votos de longa vida a V. Exa., doutor Cavaco Silva.
Longa vida mesmo depois de ter deixado de descontar para a Caixa Geral de Aposentações.

* Escrevi-o para o DRV, mas não acho o recorte, pelo que não sei a data exacta da publicação.

** O Instituto Universitário de Viseu foi criado na fase final do governo de António Guterres mas não avançou por oposição expressa do primeiro-ministro seguinte, Durão Barroso.

Comentários

  1. Ainda bem que existem blogs como este para lembrar os comentários intencionalistas dos nossos políticos ( antes como agora):
    "Como é que nos vamos livrar deles? Reformá-los não resolve porque deixam de descontar para a Caixa Geral de Aposentações. Só nos resta esperar que acabem por morrer…”2002 Um pensamento tão atual...
    E porque não uma ditadurazita? Um espírito nazi, com crematório e tudo? E um Tarrafal? Ficavam resolvidos muitos problemas, a saber:
    - Reformas dos funcionários públicos ( a maioria professores);
    - O problema do aumento da esperança média de vida ( com as contas do governo a esperança média de vida vai passar a 100 anos, brevemente - as mulheres mais dois anos);
    - Desde 2002 até 2015 tantos erros...e quem vai pagar? Sempre os mesmos!
    Futuro?
    Nem com uma bola de cristal, pois depende da maioria das intenções de voto!
    Liberdade ou ditadura?
    E depois? Vai ser necessário outro 25 de Abril?
    Mas como se costuma dizer: " A esperança é a última a morrer".É o que resta!

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  2. Tiro ao Cavaco ou a verdade de um não Presidente?

    1. Memória:

    Em 1988, o então primeiro-ministro Cavaco Silva recusou atribuir a Salgueiro Maia uma pensão, que tinha sido pedida pela viúva de Salgueiro Maia, pelos "serviços excepcionais e relevantes prestados ao país" devido à participação no 25 de Abril, por Salgueiro Maia.
    A recusa ou a falta de resposta ao pedido só vieram a público três anos depois quando Cavaco Silva concordou com a atribuição de pensões a dois ex-inspectores da PIDE, um dos quais estivera envolvido nos disparos sobre a multidão concentrada à porta da sede daquela polícia política.
    Só em 1995, já com António Guterres como primeiro-ministro, Salgueiro Maia viria a receber uma "pensão de sangue".

    No entanto, em 2009, no âmbito das comemorações do 10 de Junho, que decorreram na cidade de Santarém, o Presidente da República depositou uma coroa de flores junto à estátua de Salgueiro Maia. Uma tentativa de “branquear” a atitude de vinte anos antes…

    Sobre a falta de Cavaco Silva, ao funeral de José Saramago, o conselheiro de Estado Marcelo Rebelo de Sousa desvalorizou a ausência afirmando: «Está presente espiritualmente».
    Já em 2013 Cavaco Silva destacou os efeitos positivos da aprovação da sétima avaliação da Troika para Portugal para declarar que se tratou de uma “inspiração de Nossa Senhora de Fátima”.
    Carlos do Carmo? Quem é? Um morador no largo do Carmo, não é?
    E ainda há mais: etc…etc….etc….

    Um Presidente que Abril proporcionou e nunca um cravo vermelho colocou na lapela.
    De Cavaco não teremos saudades. Um mau Presidente da República!

    2. Realidade:

    Uma Assembleia da República sem ideais, um Presidente da República que nos arremeda - o retrato da nossa condição actual.

    Está hoje tudo mais claro que nunca : a Democracia é "o conflito, a dialética", como afirmou Eanes. O general Eanes foi o único que fez mais valia teórica, porque ainda gosta de estudar. Foi bom recordar que a democracia é essencialmente crise, como é típico de um Estado que quer ser racionalidade e, portanto, tem de gerir as crises de modo dinâmico.

    3. O Futuro

    “Precisamos de um Presidente da República que não venha a ser presidente de outro partido qualquer. Estamos a acabar o segundo mandato de um Presidente que tem sido uma lástima, um desastre, é presidente de uma facção, acabou com aquilo que Eanes, Soares e Sampaio protagonizaram. Uma vez eleitos foram presidentes de todos os portugueses. Não podemos agora correr o risco de ter um presidente que seja o presidente de outro partido qualquer. Agora é do PSD, a seguir é do PS. Não pode ser! Temos de ter um Presidente que seja capaz de ser o Presidente de todos os portugueses.” – Vasco Lourenço – jornal i online, 27 abr. 15

    Um novo ciclo para Portugal se aproxima e nós temos a obrigação de lutar por ele.

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